O tempo de deslocamento é uma realidade diária para milhões de trabalhadores, mas sua contabilização como parte da jornada de trabalho é uma questão cercada de nuances legais.
Desde a Reforma Trabalhista de 2017, mudanças significativas transformaram a forma como a legislação brasileira trata o deslocamento, alterando direitos e flexibilizando regras por meio de acordos coletivos.
Apesar disso, ainda existem situações específicas em que o tempo despendido em trânsito pode ser considerado como hora trabalhada, como em viagens corporativas ou condições negociadas entre empregadores e sindicatos.
Neste artigo, exploramos o que caracteriza o tempo de deslocamento, suas implicações na jornada laboral e os direitos dos trabalhadores diante dessa questão.
Além disso, esclarecemos conceitos como horas in itinere, que já tiveram maior relevância na legislação, mas foram alteradas pela nova redação do artigo 58 da CLT.
Abordamos ainda o impacto do tempo de deslocamento em casos de viagens a trabalho, consultas médicas e as possibilidades de flexibilização por meio de políticas internas e convenções coletivas.
Compreender as nuances dessa temática é o primeiro passo para empresas e profissionais de Recursos Humanos que buscam soluções alinhadas à legislação, sem comprometer a qualidade de vida e a produtividade dos trabalhadores.
O que é considerado como tempo de deslocamento?
A definição de tempo de deslocamento, também chamado de “tempo de trajeto” refere-se ao período que um trabalhador leva para ir de sua residência ao seu local de trabalho.
Essa questão se torna especialmente relevante ao discutirmos a jornada de trabalho e as condições sob as quais esse tempo pode ser contabilizado como expediente propriamente dito.
De antemão, podemos dizer que a legislação trabalhista nacional estabelece que o deslocamento para o trabalho não é considerado parte da jornada normal de trabalho, conforme o Art. 58 da CLT.
Antes da Reforma Trabalhista de 2017, havia maior flexibilidade no tratamento das horas de deslocamento, que poderiam ser vistas como horas extras.
Contudo, com as mudanças nas leis, as empresas não são mais obrigadas a reconhecer o tempo de deslocamento como hora de disponibilidade do trabalhador. No entanto, existem exceções.
- Por exemplo: para casos de viagens corporativas, o tempo de deslocamento é geralmente reconhecido como parte da jornada de trabalho e deve ser adequadamente remunerado.
O que diz a CLT sobre tempo de deslocamento?
A legislação brasileira, especialmente a CLT, é o principal instrumento jurídico utilizado para a regulamentação das horas de deslocamento dos trabalhadores.
Antes da Reforma Trabalhista de 2017, as horas in itinere (vamos explicar esse conceito mais à frente) eram consideradas como tempo de serviço para os trabalhadores que realizavam viagens corporativas.
A partir da Lei 13.467/2017, houve uma mudança significativa, excluindo o tempo de deslocamento como parte do horário de trabalho.
Da mesma forma, anteriormente, o §2º do artigo 58 da CLT e a Súmula 90 do TST definiam que o tempo de deslocamento em locais de difícil acesso e o transporte fornecido pelo empregador poderiam ser contabilizados. Entretanto, a prática mudou com a nova legislação.
O tempo gasto pelo empregado entre sua residência e o posto de trabalho não é mais computado como jornada de trabalho, mesmo que o transporte seja fornecido pela empresa.
Veja abaixo:
“Art. 58 – A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite (…)
§ 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador.”
Ou seja: o tempo de deslocamento ao trabalho, e do trabalho para casa, não conta como hora trabalhada já que não está à disposição do contratante.
Nesse sentido, a legislação brasileira atual reflete uma nova visão sobre o horário de trabalho e as horas in itinere, destacando que o tempo de deslocamento não será considerado parte da jornada de trabalho.
O que são horas in itinere? Entenda o conceito
A expressão em latim horas in itinere é utilizada para descrever o tempo que um trabalhador passa em deslocamento até seu local de trabalho e vice-versa.
A legislação brasileira aborda esse tema de maneira detalhada, especialmente no artigo 58, parágrafo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Na época pré-aprovação da Reforma Trabalhista, a legislação estabelecia que, em determinadas circunstâncias, esse período deve contar como parte da jornada de trabalho.
Tais circunstâncias incluíam, por exemplo, o trabalho realizado em locais de difícil acesso, com transporte fornecido pelo empregador.
Porém, como já citamos, houveram alterações significativas com a Reforma. A partir daí, o tempo de deslocamento do trabalhador da sua residência até o local de trabalho não foi mais contabilizado na jornada.
Tempo de deslocamento conta como hora trabalhada?
Para entender a questão do tempo de deslocamento e sua relação com a hora trabalhada, a melhor estratégia é considerar a legislação trabalhista e as decisões judiciais pertinentes.
De acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho atual, o tempo gasto pelo empregado entre sua residência e o local de trabalho não é classificado como hora trabalhada.
Entretanto, a situação se torna mais complexa quando analisamos situações específicas, como viagens a trabalho.
Considerando que a maioria dos trabalhadores leva, em média, 50 minutos para se deslocar até o trabalho, é importante citar que o tempo de deslocamento em viagens a trabalho, especialmente em cidades diferentes, é contabilizado como hora extra.
Para esses casos, é obrigatório que as horas de deslocamento sejam computadas, principalmente se o colaborador trabalhar além do que foi contratado.
No que diz respeito a despesas relacionadas ao deslocamento nas viagens, a legislação também prevê que todas as despesas de alimentação, transporte e hospedagem devem ser cobertas ou reembolsadas pela empresa.
Mas, em casos que não englobam viagens profissionais, o tempo de deslocamento não conta como hora trabalhada, e por isso, não precisa ser remunerado.
Direitos dos trabalhadores em relação ao tempo de deslocamento
A legislação brasileira deixa bem claro que os direitos dos trabalhadores referentes ao tempo de deslocamento passaram por mudanças significativas com a Reforma de 2017.
Antes dessa reforma, havia diretrizes que garantiam remuneração em algumas situações de “horas in itinere“, ou seja, o tempo gasto entre a residência e o trabalho.
Entretanto, esta regra foi modificada e atualmente o tempo de deslocamento não é considerado parte da jornada de trabalho.
De acordo com a nova redação no artigo 58 da CLT, o tempo de deslocamento do empregado até a sua função não é mais contabilizado para fins de remuneração, mesmo em locais de difícil acesso ou sem transporte público disponível.
A regra também vale para situações em que o empregador fornece transporte.
Na prática, a alteração implica que, mesmo em circunstâncias excepcionais, como trabalhadores em minas ou plataformas de petróleo, a responsabilidade sobre o tempo de deslocamento foi transferida aos empregados.
Todas essas mudanças levantam questões importantes sobre os direitos dos trabalhadores e as novas responsabilidades de empregadores em relação à remuneração do tempo de deslocamento.
Como calcular o tempo de deslocamento ao trabalho?
O cálculo de tempo de deslocamento ao trabalho é uma boa estratégia para entender melhor quanto tempo cada funcionário gasta para chegar à empresa.
Para realizar este cálculo, é preciso considerar a distância percorrida e a velocidade média do deslocamento. A fórmula básica para determinar o tempo gasto em deslocamento é:
- Tempo = Distância / Velocidade
Por exemplo, se um trabalhador percorre 30 km a uma velocidade média de 60 km/h, o tempo de deslocamento será de:
- Tempo = 30 km / 60 km/h = 0,5 horas (30 minutos)
Para facilitar esse cálculo, pode ser interessante manter um diário e atualizá-lo todos os dias com o tempo gasto, incluindo variáveis como trânsito e transporte público.
Tempo de deslocamento nas viagens a trabalho
As viagens a trabalho exigem um entendimento claro sobre como o tempo de deslocamento se insere nas jornadas diárias.
Nesse caso, o tempo que um colaborador passa em deslocamento, seja para reuniões ou conferências, é considerado parte da jornada de trabalho e, portanto, deve ser contabilizado para fins de pagamento e direitos trabalhistas.
As diferenças entre deslocamentos locais e viagens a trabalho têm implicações significativas.
Durante viagens a trabalho, os empregados podem ser considerados à disposição do empregador enquanto estão esperando em aeroportos ou viajando para o local de destino.
Por outro lado, períodos de descanso em hotéis ou o tempo livre durante a viagem não entram na contagem do tempo de trabalho.
O pagamento de horas extras é outro aspecto importante. Caso o tempo de deslocamento extrapole a carga horária estabelecida — geralmente de 44 horas semanais —, as horas adicionais devem ser pagas com um acréscimo de 50% ou até mesmo 100% para feriados.
Confira mais detalhes sobre as regras das viagens a trabalho abaixo:
- Despesas de viagem, como diárias e reembolsos, estão previstas pela CLT e devem ser pagas às empresas, incluindo transporte, alimentação e hospedagem.
- Adicional de viagem pode ser uma prática adotada por empresas, embora não previsto na legislação brasileira.
- Colaboradores devem ser claros sobre suas obrigações, guardando notas fiscais e registrando ponto.
Tanto os empregadores quanto os colaboradores precisam estar alinhados quanto às condições de trabalho durante viagens, incluindo o entendimento sobre horas trabalhadas e como elas serão remuneradas.
Dessa forma, as jornadas de trabalho em situações de viagens a trabalho se tornam mais justas e transparentes, beneficiando ambos os lados da relação laboral.
Para fazer isso na prática, uma boa alternativa é utilizar o aplicativo de ponto eletrônico digital da Genyo!
Com ele, os colaboradores podem registrar o ponto de onde estiverem, com ou sem internet. E o RH, por sua vez, pode acompanhar todas as marcações em tempo real.
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Tempo de deslocamento como hora trabalhada em acordos coletivos
A legislação trabalhista brasileira, com base no artigo 58, § 2º, da CLT, estabelece que o tempo de deslocamento do empregado entre sua residência e o local de trabalho, independentemente do meio de transporte utilizado, não é computado como jornada de trabalho.
O entendimento parte do princípio de que o trabalhador não está à disposição do empregador durante esse período.
Contudo, a Reforma Trabalhista de 2017 trouxe uma importante mudança ao reforçar a prevalência dos acordos e convenções coletivas sobre a legislação.
Isso significa que, mesmo com a regra geral da CLT, empregadores e sindicatos podem negociar condições específicas, incluindo o reconhecimento do tempo de deslocamento como hora trabalhada.
Como funciona essa flexibilização na prática?
A Reforma Trabalhista incluiu na CLT o artigo 611-A, que confere aos acordos e convenções coletivas maior peso jurídico. Entre os temas que podem ser negociados está a jornada de trabalho.
“Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
I – pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais”
Assim, empregadores e funcionários podem estabelecer cláusulas que tratem o tempo de deslocamento como parte integrante da jornada, desde que haja consenso entre as partes.
Essa flexibilização é particularmente relevante em situações específicas, como:
- Empregados que trabalham em locais de difícil acesso ou em áreas remotas, onde o transporte é fornecido pelo empregador.
- Setores em que longos deslocamentos são comuns, como indústrias localizadas em zonas rurais ou regiões afastadas dos centros urbanos.
- Realidades regionais em que o transporte público é limitado, tornando o deslocamento uma condição peculiar do trabalho.
Ainda que seja possível incluir o deslocamento como hora trabalhada por meio de acordos, essa prática deve respeitar certos critérios:
- Definição clara no acordo ou convenção coletiva: O documento deve especificar os períodos de deslocamento computados e os direitos decorrentes, como remuneração ou compensação.
- Negociação coletiva regular: A validade da cláusula depende de uma negociação coletiva, respeitando a periodicidade e os trâmites previstos na legislação.
- Compatibilidade com outros direitos trabalhistas: Qualquer regra negociada não pode suprimir direitos essenciais, como os previstos no artigo 7º da Constituição Federal.
Tempo de deslocamento atestado médico: abona horas?
Quando um trabalhador apresenta um atestado médico, as horas de ausência no trabalho são justificadas e, geralmente, abonadas pelo empregador.
- No entanto, surge a dúvida: o tempo de deslocamento ao médico ou à unidade de saúde também é considerado como abono?
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não trata especificamente do tempo de deslocamento para consultas ou atendimento médico como motivo de abono de horas.
A obrigatoriedade do abono refere-se apenas ao período em que o trabalhador está efetivamente em atendimento, desde que seja apresentado um atestado ou declaração emitida pelo médico que justifique a ausência.
Nesse contexto, a declaração de comparecimento é um documento que comprova o período em que o trabalhador esteve na unidade de saúde.
O documento, no entanto, costuma limitar-se ao horário da consulta ou do procedimento, sem incluir o tempo de deslocamento até o local e o retorno ao trabalho.
Isso significa que, salvo disposição contrária em acordo coletivo ou política interna da empresa, o deslocamento não é automaticamente considerado como período abonado.
O abono do tempo de deslocamento pode ocorrer em situações específicas:
- Acordos ou convenções coletivas: Empresas e sindicatos podem negociar cláusulas que reconheçam o tempo de deslocamento como parte do abono, principalmente em casos de dificuldade de acesso ao local de atendimento.
- Políticas internas da empresa: Algumas organizações adotam práticas mais flexíveis, abonando todo o período necessário para consultas, incluindo o deslocamento.
- Casos de emergência: Em situações em que o trabalhador precise de atendimento urgente, o deslocamento pode ser interpretado como parte do tempo de ausência justificada.