Na última quinta-feira, dia 22 de março, o Tribunal Regional Federal da 6ª Região concedeu uma liminar desobrigando as empresas de divulgarem o relatório de transparência e igualdade salarial.
Em termos mais práticos, a Justiça suspendeu a entrega do documento, que serve para atestar a equidade de salários entre os gêneros.
A entrega compulsória do Relatório de Transparência Salarial (RTS), que englobava as empresas com 100 ou mais funcionários, havia gerado discussões e preocupações relacionadas à privacidade dos dados e à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
A decisão da Justiça atendeu a um pedido da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e suspende a entrega do relatório até que o caso seja julgado.
Na matéria abaixo, você pode conferir mais detalhes sobre a decisão e entender o impacto do decreto para as empresas. Fique de olho!
O que é o Relatório de Transparência e Igualdade Salarial?
Em 3 de julho de 2023, o Governo Federal sancionou a Lei nº 14.611, que trata da igualdade salarial e das diferenças entre a remuneração de homens e mulheres no ambiente de trabalho, modificando o artigo 461 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Nesse cenário, empresas com mais de 100 funcionários foram obrigadas a adotar medidas para garantir essa igualdade. Essas medidas incluem, por exemplo:
- Transparência salarial,
- Fiscalização contra discriminação,
- Criação de canais de denúncia,
- Incentivo a programas de diversidade e inclusão,
- Apoio à capacitação profissional das mulheres.
A lei em questão surgiu como uma iniciativa conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério das Mulheres.
O prazo para a entrega do relatório terminou em março, e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) estava coletando as informações para divulgar um ranking das empresas de acordo com a nova regra.
O caráter compulsório do documento, no entanto, causava preocupações por parte das empresas, pois poderia violar a privacidade dos dados e entrar em conflito com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Por isso, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) entrou com uma ação pedindo a suspensão da entrega – falaremos mais sobre isso abaixo.
TRF suspende entrega do Relatório de Transparência Salarial
No processo citado, a Justiça Federal de Minas Gerais concedeu uma liminar em favor da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), suspendendo a obrigatoriedade de divulgação do relatório de transparência e igualdade salarial.
A decisão foi proferida em resposta ao pedido da Fiemg, que argumentou que a divulgação do relatório teria a possibilidade de violar a privacidade dos dados e entrar em conflito com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Em termos práticos, a liminar impede a entrega do relatório até que o caso seja julgado pela Justiça. Ou seja: as empresas não apenas estão desobrigadas a enviar o documento, mas também impedidas de fazê-lo.
Para a Fiemg, essa decisão é de extrema importância, pois visa proteger a privacidade dos brasileiros, especialmente das mulheres.
A obrigatoriedade de divulgação do relatório gerava apreensão e discussões no setor produtivo, e a liminar concedida demonstra um reconhecimento por parte da Justiça das questões relacionadas à proteção de dados e à privacidade das informações empresariais.
Ao suspender a obrigatoriedade, a decisão da Justiça Federal traz alívio para as empresas que estavam apreensivas com a divulgação de dados sensíveis e as possíveis consequências legais relacionadas à proteção de dados estabelecidas pela LGPD.
Por que as empresas questionaram o relatório de igualdade salarial?
Desde o anúncio por parte do Governo Federal, a obrigatoriedade de divulgar o relatório de transparência e igualdade salarial tem gerado grande polêmica no setor corporativo.
Muitas empresas alegaram que essa medida poderia resultar em violação de direitos e que não foram estabelecidos mecanismos adequados de compatibilização entre a anonimização dos dados e a publicidade das informações obrigatórias.
Da mesma forma, como citamos anteriormente, as empresas questionaram a falta de requisitos mínimos de segurança previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Tais preocupações destacam a importância de garantir a proteção da privacidade e a segurança das informações sensíveis das empresas e de seus funcionários.
A obrigatoriedade de divulgar dados salariais também levanta questões legítimas sobre a relação entre a transparência e a proteção dos direitos constitucionais e das legislações relacionadas à privacidade e à proteção de dados.
A decisão judicial suspendendo a obrigatoriedade de divulgação do relatório foi vista como uma vitória pelo setor produtivo, pois permitirá uma análise mais aprofundada das questões levantadas pelas empresas.
É fundamental que haja um debate amplo e equilibrado para encontrar soluções que conciliem a necessidade de transparência com a preocupação com a segurança e a proteção dos direitos individuais e coletivos.
Cade se pronuncia sobre o relatório de igualdade salarial
Em meio à polêmica sobre o documento, o Departamento de Estudos Econômicos do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) emitiu uma nota técnica em que analisa as normas regulamentadoras relacionadas à igualdade salarial.
Segundo o Cade, a obrigatoriedade de divulgação de relatórios com dados sobre remuneração dos trabalhadores pode configurar a publicação de dados concorrencialmente sensíveis e contribuir para a adoção de condutas concertadas anticompetitivas.
“Sugere-se, também, que tais dispositivos sejam reavaliados no sentido de que, caso se entenda necessário manter a publicação dos relatórios pelas empresas em seus próprios sites, os mesmos não contenham informações capazes de sinalizar aos demais agentes do mercado a política de remuneração da empresa para os seus empregados individualmente ou para determinado cargo ou função”, diz a nossa técnica em questão.
Diante disso, o Cade recomendou também a suspensão ou o cancelamento de instruções contidas nessas normas.
Em contrapartida, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) rebateu a nota do Cade, criticando o posicionamento do órgão sobre o relatório de transparência salarial.
“Não vejo nenhum prejuízo que as empresas, que os empresários e que especialmente as entidades empresariais vêm falando. Seja na Lei de Proteção de Dados, estamos rigorosamente respeitando a lei de proteção de dados”, opinou o ministro Luiz Marinho.
Suspensão do Relatório de Igualdade Salarial na prática
A Justiça suspendeu os efeitos das normas do Ministério do Trabalho e Emprego que obrigavam as empresas a divulgar relatórios de transparência salarial.
A suspensão foi em caráter liminar e atendeu ao pedido da Fiemg, mas tem efeito para todas as empresas do país.
Na prática, as empresas não precisam, e não podem mais entregar o Relatório de Transparência Salarial – pelo menos até a Justiça analisar o recurso do MTE.
Outras ações sobre o tema na Justiça
Além da ação da Fiemg, outras entidades de representação empresarial entraram na Justiça contra a publicação do Relatório de Transparência Salarial.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação Nacional de Bens, Serviços e Turismo (CNC) moveram uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando trechos da lei que obriga o pagamento de salários iguais para homens e mulheres na mesma função.
As entidades alegam que a norma desconsiderou hipóteses legítimas de diferenças salariais baseadas na antiguidade na empresa e consideram esses trechos inconstitucionais.
Desigualdade salarial: Multas e penalidades
A legislação brasileira estabelece multas administrativas para o descumprimento das obrigações relacionadas à igualdade salarial. Estas multas, inclusive, já eram previstas antes mesmo do período de entrega da declaração de transparência.
De acordo com a legislação nacional, os valores das multas podem variar, correspondendo a até 3% da folha de salários do empregador. No entanto, há um limite de 100 salários mínimos para a aplicação da penalidade.
Além disso, é importante ressaltar que a exposição indevida de dados pessoais, em contravenção à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), também pode incorrer em multas significativas.
A LGPD prevê multas que podem chegar a até R$ 50 milhões em casos de infração. Portanto, as empresas devem tomar todas as medidas possíveis para evitar o compartilhamento indevido de informações delicadas.
O que diz o Governo?
O governo está comprometido em promover a igualdade salarial entre homens e mulheres, garantindo a isonomia e a remuneração igualitária.
Segundo a legislação vigente, as mulheres devem receber a mesma remuneração se possuírem as mesmas características e o mesmo tempo de função. A diferença salarial somente pode ser justificada pelo tempo de trabalho, não pela discriminação de gênero.
O governo não vê prejuízo às empresas com a divulgação do relatório de transparência e igualdade salarial e destaca o respeito pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
A divulgação dessas informações é fundamental para estimular a transparência e combater a discriminação de gênero no mercado de trabalho.
A remuneração igualitária é um direito constitucional e uma prática essencial para garantir a justiça social e a valorização de todos os profissionais independentemente do gênero.
Cade voltou atrás em sua posição?
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) esclareceu recentemente que a nota técnica emitida pelo Departamento de Estudos Econômicos não representa necessariamente a posição oficial do órgão.
O Cade reforçou que sua competência está relacionada à concorrência na economia brasileira e que não possui competência para tratar de política trabalhista.
A nota técnica emitida pelo departamento será discutida internamente no Cade, buscando contribuir para o debate sobre a política pública da igualdade salarial.
O órgão reconhece a importância do tema, porém destaca que sua atuação se concentra na transversalidade na economia e na competência concorrencial.